O recurso patético ao proparoxítono humorístico ou sarcástico ou satírico

O recurso patético ao proparoxítono humorístico ou sarcástico ou satírico

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Die Maskerade auch liebt


Eu não aparecerei quando tu chamas,
Pois estou já contigo ao teu chamar.
Quando em ti penso, estás dentro de mim,
E tudo é já teu próprio pensar.

Tua presença de ausência se veste
Em teu corpo, onde a alma escondida.
É em minha mente que inteira estás
E é em mim que tu és possuída.

Fora de ti, dado ao espaço e ao tempo
Teu corpo, mero tu, de mim ausente,
Partilha a mudança, o tempo e o lugar,
Pertence a outra lei, de ti diferente.

No meu sonho de ti nada te altera
Em outra, que contigo se compara.
Tua presença corpórea é só a parte
De ti, que a ti de ti separa.

Por isso chama, mas sem me esperares.
Tua voz, ao meu sonho acrescentada,
Juntará mais beleza ao meu pensar
Teu corpo, vivo na mente habitada.

A tua voz ouvida da distância
Mais aproxima tua sonhada presença.
Mais nítida e clara que parecia,
Na minha fantasia fica imensa.

Não chames mais. Tua voz duas vezes
Repetida no espaço verdadeiro,
Quase seria como a realidade.
O segundo som, o eco do primeiro.

Chama uma só vez. E que eu imagine
No segundo apelo, de olhos cerrados,
A visão do teu corpo a cintilar
Na memória visível dos teus brados.

O resto será teu prolongamento,
Olhos fechados p’ra não sentir,
No apelo premente de meu sonho.
Fica longe, calada, mas sem vir,

Pois virias perto de mais à vista
E de meu pensamento irias para ti
Vestindo em mim teu corpo sonhado
(O sonho do teu corpo é infinito)
Com teu limite, o visualizado.

[A Fuga - Fernando Pessoa]

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.